Processo Penal - Das Provas.





1. CONCEITO

De acordo com a doutrina do saudoso Prof. Julio Fabbrini Mirabete, “provar é produzir um estado de certeza, na consciência e mente do juiz, para sua convicção, a respeito da existência ou inexistência de um fato, ou da verdade ou falsidade de uma afirmação sobre uma situação de fato que se considera de interesse para uma decisão judicial ou a solução de um processo” (op. cit. p. 256). A prova, assim, é o instrumento de verificação dos fatos relevantes para a decisão das questões controvertidas do processo.

É importante distinguir o objetivo (ou finalidade) da prova com o objeto da prova. O objetivo da prova, segundo Fernando da Costa Tourinho Filho, “é a formação da convicção do juiz sobre os elementos necessários para a decisão da causa” enquanto o objeto da prova “são todos os fatos, principais ou secundários, que reclamem uma apreciação judicial e exijam uma comprovação” (op. cit. p. 222).

Alguns fatos não precisam ser objeto de prova, dispensando-se a sua produção. São eles:


a) os fatos notórios, que são aqueles conhecidos e incontestados por toda a sociedade;
b) os fatos intuitivos (ou axiomáticos), que são aqueles que se apresentam de modo evidente por si mesmo (exemplo: um cadáver putrefato – não é necessário provar que a pessoa estava morta);
c) os fatos presumidos pela lei, ou seja, aqueles tomados como verdadeiros pelo legislador, independentemente de prova (exemplo: presunção de violência nos crimes contra os costumes – art. 224, CP);

d) os fatos inúteis para a apuração da causa.

2. MEIOS DE PROVA E SUA ADMISSIBILIDADE

Meio de prova, segundo Fernando da Costa Tourinho Filho, “é tudo quanto possa servir, direta ou indiretamente, à comprovação da verdade que se procura no processo” (op. cit. p. 225). O Código de Processo Penal prevê como meio de prova os seguintes instrumentos: o exame de corpo de delito e as perícias, o interrogatório do acusado, a confissão, as perguntas ao ofendido, as testemunhas, o reconhecimento de pessoas e coisas, a acareação, os indícios e a busca e apreensão.

Não há limitação dos meios de prova no processo penal brasileiro, em virtude do princípio da verdade real, o que nos faz concluir que os meios de provas não são exclusivamente aqueles previstos em lei, admitindo-se também as provas inominadas, tendo como exemplo destas últimas a chamada prova emprestada.

Para o prof. Antonio Scarance Fernandes, considera-se prova emprestada “aquela que é produzida num processo, sendo depois transportada documentalmente para outro, visando a gerar efeitos neste; ou ainda, na definição clássica, aquela que já foi produzida juridicamente, mas em outra causa, da qual se extrai para aplicá-la à causa em questão” (Processo penal constitucional., 3. ed., São Paulo: RT, 2002, p. 340). Embora não expressamente prevista em lei, é o típico exemplo de prova inominada. Para a sua admissibilidade no processo é necessário que tenha sido produzida em processo formado entre as mesmas partes e, portanto, submetido ao contraditório.

Não se admitem, contudo, as provas proibidas pelo nosso ordenamento: as ilícitas e as ilegítimas. São ilícitas todas as provas que violarem normas legais de direito material como, por exemplo, as provas obtidas mediante tortura, mediante interceptação telefônica ilegal (fora das hipóteses da Lei 9.296/1996), incluindo-se, aqui, as violações às normas constitucionais, e ilegítimas todas aquelas que violarem regras de direito processual. Todavia, após a reforma processual penal de 2008, mais especificamente aquela parcela atinente às alterações promovidas ao capítulo das provas (Lei 11.690/2008), passa-se a admitir como prova ilícita aquela violadora de regras materiais (constitucionais e infraconstitucionais, relativas a Direito Penal, até então chamadas de provas ilícitas) e processuais (até então denominadas como provas ilegítimas). Atualmente, não há mais razão para distinguir prova ilícita de prova ilegítima, já que a violação a regras constitucionais ou legais (aqui, tanto faz se de cunho material ou processual) acarretará a ilicitude da prova.


Por fim, resta consignar outro importante meio de prova, atualmente bastante difundido, qual seja a interceptação das comunicações telefônicas, regulamentada pela Lei 9.296/1996, que, para sua admissão, deve observar os seguintes requisitos: 
I – indícios razoáveis da autoria ou participação em infração penal; 
II – que não exista outro meio de produzir a prova; 
III – que o crime seja apenado com reclusão. Trata-se, portanto, de meio de prova subsidiário, ou seja, somente se não houver outra maneira de ser provada a autoria é que será utilizado. O procedimento para a sua produção será sigiloso e correrá em autos apartados.

3. A VEDAÇÃO DAS PROVAS OBTIDAS POR MEIOS ILÍCITOS. “NOVIDADES” INSERIDAS AO CPP PELA LEI 11.690/2008

Embora o sistema processual penal brasileiro admita enorme variedade de meios probatórios, além dos previstos expressamente no CPP, é bem verdade que a Constituição Federal, em seu art. 5.º, LVI, declara a inadmissibilidade das provas obtidas por meios ilícitos.

Conquanto o tema já tivesse sido tratado pela Lei Maior, a Lei 11.690/2008 cuidou de inserir a disciplina das “provas ilícitas” no CPP, mais especificamente no art. 157, que assim passou a dispor: “São inadmissíveis, devendo ser desentranhadas do processo, as provas ilícitas, assim entendidas as obtidas em violação a normas constitucionais ou legais”.


Sobre a admissibilidade de prova derivada da ilícita, temos a teoria dos frutos da árvore envenenada (fruits of the poisonous tree), acolhida pela doutrina e pela jurisprudência do Supremo Tribunal Federal. Segundo essa teoria, todas as provas lícitas cuja produção resultou de uma prova ilícita ficarão contaminadas, tornando-se, portanto, nulas. Como exemplo mais comum temos a situação de uma apreensão de substâncias entorpecentes numa residência decorrente de informações obtidas por intermédio de interceptação telefônica sem a observância do procedimento previsto na Lei 9.296/1996 (a apreensão da droga seria uma prova ilícita por derivação).

A questão da prova ilícita por derivação (ou prova derivada), até então tratada pela doutrina e jurisprudência, ganha expressa regulamentação pela Lei 11.690/2008, que inseriu ao art. 157 o § 1.º: “São também inadmissíveis as provas derivadas das ilícitas, salvo quando não evidenciado o nexo de causalidade entre umas e outras, ou quando as derivadas puderem ser obtidas por uma fonte independente das primeiras”.

Assim, a prova derivada somente será admitida no processo se obtida de forma independente 

daquela ilicitamente obtida. Considera-se fonte independente, de acordo com o § 2.º, do referido dispositivo legal, “aquela que por si só, seguindo os trâmites típicos e de praxe, próprios da investigação ou instrução criminal, seria capaz de conduzir ao fato objeto da prova”.


Indagação relevante é aquela concernente à excepcional admissão de uma prova ilícita no processo penal. A vedação constitucional, e agora legal, das provas ilícitas, que devem ser desentranhadas do processo, entretanto, é mitigada pelo princípio da proporcionalidade, também acolhido pela jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, decorrente da teoria do sacrifício, que determina a realização de um juízo de ponderação pelo magistrado, diante do caso concreto, sobre qual a garantia fundamental em conflito com outra que deverá prevalecer (de um lado o direito constitucional de defesa do réu, e do outro a paz social). 

Assim, se diante de um caso concreto a interceptação telefônica ilegal tiver sido o único meio encontrado para tornar possível a apreensão das substâncias entorpecentes e a prisão dos criminosos, a referida prova pode ser admitida, viabilizando, dessa forma, a repressão do crime. No mesmo sentido, a prova ilícita produzida pelo réu para demonstrar a sua inocência, como, por exemplo, a interceptação telefônica ilegal e a violação de domicílio de outrem para a obtenção de documentos, deve ser admitida como lícita no processo, pelo fato de traduzir também hipótese de legítima defesa, que exclui a ilicitude da conduta.

Finalmente, por força do já citado art. 157, § 1.º, do CPP, as provas reconhecidas como ilícitas deverão ser desentranhadas do processo e, ato seguinte, serão inutilizadas por decisão judicial, facultado às partes acompanhar o incidente. Portanto, se considerada ilícita determinada prova, deverá o magistrado, sem prejuízo de ordenar o seu desentranhamento dos autos, mandar inutilizá-la (ex.: incineração).


4. PRODUÇÃO DAS PROVAS

Em regra, a prova será produzida pelas partes (Ministério Público, querelante, acusado, ou querelado) e, excepcionalmente, pelo juiz (art. 156 do CPP) na fase da instrução criminal, com observância dos princípios constitucionais do contraditório e da ampla defesa, para que possa proferir o julgamento. A atuação do magistrado, em matéria probatória, deve ser supletiva à das partes. Isso não impede que certas provas, como a testemunhal, sejam produzidas perante outra autoridade competente por intermédio de carta precatória, rogatória ou de ordem, e em qualquer fase do processo. Não vigorava no processo penal o princípio da identidade física do juiz, segundo o qual a autoridade judicial que colhesse a prova seria aquela competente para decidir. Com a edição da Lei 11.719/2008, o art. 399, § 2.º, passou a ter a seguinte redação: “O juiz que presidiu a instrução deverá proferir a sentença”.

Ainda, fruto das recentes alterações do CPP, a “inércia” probatória do magistrado, que deve ser 
a regra, ganha novas feições. Vejamos o disposto no novo art. 156: “A prova da alegação incumbirá a quem a fizer, sendo, porém, facultado ao juiz de ofício:

I   – ordenar, mesmo antes de iniciada a ação penal, a produção antecipada de provas consideradas urgentes e relevantes, observando a necessidade, adequação e proporcionalidade da medida;
II  – determinar, no curso da instrução, ou antes de proferir sentença, a realização de diligências para dirimir dúvida sobre ponto relevante”.

Trata-se de nítida inserção, no processo penal brasileiro, de traços de inquisitoriedade, vale dizer, o futuro órgão julgador, antes mesmo de iniciada a ação penal, poderá determinar a realização de provas urgentes e relevantes (inciso I do dispositivo legal acima transcrito). Cremos, contudo, que não poderá haver abuso por parte da autoridade judiciária, sob pena de a imparcialidade, essencial ao desenvolvimento de um processo justo (e legal), ser quebrada.


Quanto à sua produção, temos a figura do ônus da prova, que é a faculdade ou encargo da parte em demonstrar no processo a veracidade de um fato que alegou em seu interesse, o qual se apresenta como relevante para o julgamento da pretensão deduzida pelo autor da ação penal. Dessa forma, a acusação deve provar os fatos constitutivos (prova do fato, da autoria, dos elementos subjetivos do crime – dolo/culpa – e das circunstâncias que acarretam o aumento da pena) e a defesa, os fatos impeditivos (inexistência material do fato, atipicidade, excludentes da ilicitude etc.), modificativos (causa de diminuição da pena, benefícios penais, desclassificação de crime etc.) e extintivos (prescrição, decadência, anistia etc.) do direito de punir do Estado. Veja a seguir o resumo esquemático:



A regra do ônus da prova não é absoluta, pois o art. 156 do CPP, com a redação alterada pela Lei 11.690/2008, permite ao juiz ordenar, mesmo antes de iniciada a ação penal, a produção antecipada de provas consideradas urgentes e relevantes, observando a necessidade, adequação e proporcionalidade da medida (inciso I) ou, ainda, determinar, no curso da instrução, ou antes de proferir sentença, a realização de diligências para dirimir dúvida sobre ponto relevante.

5. SISTEMAS DE APRECIAÇÃO DAS PROVAS

Os sistemas, que podemos dividir em primitivo ou moderno, para a apreciação das provas sofreram profundas alterações com a evolução da justiça penal:

a) sistema primitivo:

•   sistema étnico (ou “pagão”): segundo Julio Fabbrini Mirabete, nesse sistema “a apreciação das provas era deixada ao sabor das impressões do juiz, que as aferia de acordo com sua própria experiência, num sistema empírico” (op. cit. p. 265);

•   sistema religioso (ou “ordálio”, ou “dos juízos de Deus”, ou “das provas irracionais”): nesse sistema a prova era entregue a um ser sobrenatural que decidia sobre a sua veracidade de acordo com o resultado de alguns desafios a que eram submetidas as partes. De acordo com esse sistema, o réu inocente que não se queimará quando submetido à prova do ferro em brasa teria sido absolvido por Deus;

b) sistema moderno:

•   sistema da prova legal (ou da “certeza moral do legislador”): por ele, a cada prova seria atribuído um valor pelo legislador, não podendo o juiz dele se desvincular. As expressões “a confissão é a rainha das provas” e “a testemunha é a prostituta das provas” são típicas desse sistema. Os arts. 155, parágrafo único (“somente quanto ao estado das pessoas serão observadas as restrições estabelecidas na lei civil” – inserido no parágrafo único por forças das alterações promovidas pela Lei 11.690/2008), e 158 (“quando a infração deixar vestígios, será indispensável o exame de corpo de delito, direto ou indireto, não podendo supri-lo a confissão do acusado”) do CPP representam os últimos resquícios desse sistema;

•   sistema da íntima convicção do juiz (ou da “certeza moral do juiz”): nessa espécie o juiz tem ampla liberdade para a avaliação das provas segundo o seu íntimo 
convencimento sem que seja necessária a fundamentação da decisão. Esse sistema somente é adotado no procedimento do Tribunal do Júri, no qual os jurados apenas respondem “sim” ou “não” aos quesitos formulados sem fundamentar sua decisão;


•   sistema da livre convicção do juiz (ou da “persuasão racional do magistrado”, ou da “verdade real”, ou do “livre convencimento”): esse sistema, que está previsto no art. 93, IX e X, da CF (que determina que todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário deverão ser fundamentados, sob pena de nulidade), constitui regra para todo o ordenamento. Por ele, o juiz não está vinculado ao resultado das provas, podendo livremente formar seu convencimento desde que indique expressamente as razões que o levaram àquela decisão. Mesmo diante de uma prova técnica (pericial, por exemplo), será possível, desde que devidamente motivado, a discordância do magistrado, sob pena de o perito decidir a lide penal. Insta frisar que, de acordo com as recentes alterações do CPP, é vedado ao magistrado prolatar sentença baseado exclusivamente nos elementos informativos colhidos na fase de inquérito policial, nos termos do art. 155, caput, com a redação que lhe foi dada pela Lei 11.690/2008 


6. CLASSIFICAÇÃO DAS PROVAS

Doutrinariamente, as provas são classificadas de acordo com o seu objeto, valor e fonte.
Quanto ao seu objeto, as provas podem ser diretas, quando por si só e com certeza demonstram o fato controvertido; e indiretas, quando precisam de uma ligação com outro fato para comprovar outro como, por exemplo, um álibi.

Quanto ao seu valor ou efeito, a prova pode ser plena (perfeita ou completa) ou não plena (imperfeita ou incompleta). Será plena quando for completa e convincente para a condenação, e não plena quando não for suficiente para esclarecer todas as dúvidas, sendo, portanto, insuficiente para a condenação.
Quanto à fonte, a prova pode ser pessoal, em que se envolvem declarações, como o interrogatório; e real, a que versa sobre objetos, como a arma do crime, por exemplo.

7. EXAME DO CORPO DE DELITO E PERÍCIAS EM GERAL. NOVIDADES INSERIDAS AO CPP PELA LEI 11.690/2008

Corpo de delito, segundo Julio Fabbrini Mirabete, “é o conjunto de vestígios materiais deixados pela infração penal, a materialidade do crime, aquilo que se vê, apalpa, sente, em suma, 
pode ser examinado através dos sentidos”. O corpo de delito não deve ser confundido com o exame de corpo de delito, que se refere à atividade realizada pelos peritos para a comprovação dos vestígios materiais deixados pela infração (op. cit. p. 271).


O exame de corpo de delito pode ser direto ou indireto. O direto é efetuado sobre o objeto do delito (ex.: cadáver, documento etc.) e o indireto é aquele realizado a partir de informações prestadas por testemunhas. Às vezes tal exame fica impossibilitado de ser realizado, como nas infrações que não deixam vestígios (delicta facti transeuntis) ou naquelas em que esses desaparecem. Somente nestas hipóteses, o exame pode ser dispensado e substituído por um exame indireto, que em regra é realizado por meio da oitiva de testemunhas.

As perícias são realizadas tanto na fase do inquérito como no curso da ação penal e sempre por perito oficial, portador de diploma de curso superior. Até a edição da Lei 11.690/2008, a lei exigia que o exame pericial fosse realizado por dois peritos oficiais. Mandou bem o legislador ao prescrever que o exame pericial será realizado por um só perito oficial, especialmente pelo quadro deficitário de expertos, bem como pelo dispêndio de tempo. Todavia, em caso de inexistir no local perito oficial, deverá o magistrado designar duas pessoas idôneas (e não uma apenas), as quais, portadoras de curso superior, prestarão o compromisso de bem e fielmente desempenhar o encargo que lhes seja cometido (art. 159, §§ 1.º e 2.º).

Os exames de corpo de delito serão realizados obrigatoriamente, sob pena de nulidade, se a infração deixar vestígios (delicta facti permanentis), não podendo supri-los a confissão do acusado (art. 158 do CPP).


Novidade interessante inserida à prova pericial no processo penal é a possibilidade de as partes formularem quesitos e indicarem assistentes técnicos, o que se revelava possível apenas no processo civil. Este é o teor dos §§ 3.º e 4.º do art. 157 do CPP, respectivamente: 
a) serão facultadas ao Ministério Público, ao assistente de acusação, ao ofendido, ao querelante e ao acusado a formulação de quesitos e a indicação de assistente técnico; 
b) o assistente técnico atuará a partir de sua admissão pelo juiz e após a conclusão dos exames e elaboração do laudo pelos peritos oficiais, sendo as partes intimadas desta decisão.


Havendo requerimento das partes, o material probatório que serviu de base à perícia será disponibilizado no ambiente do órgão oficial, que manterá sempre sua guarda, e na presença de perito oficial, para exame pelos assistentes, salvo se for impossível a sua conservação (§ 6.º).
Ainda, tratando-se de perícia complexa que abranja mais de uma área de conhecimento especializado, poder-se-á designar a atuação de mais de um perito oficial, e a parte indicar mais de um assistente técnico (§ 7.º).

De acordo com a Súmula 361 do STF, “no processo penal, é nulo o exame realizado por um só perito, considerando-se impedido o que tiver funcionado anteriormente na diligência de apreensão”.

O verbete encontra-se parcialmente revogado pelo atual art. 159, que prevê que o exame de corpo de delito seja realizado por apenas um perito oficial. No entanto, a segunda parte da súmula permanece íntegra (o perito que houver participado da diligência de apreensão dos vestígios deixados pela infração penal considera-se impedido para realizar o exame pericial).

Em regra, os peritos são nomeados pelo próprio juiz que preside a instrução do processo. Entretanto, no exame determinado por meio de carta precatória, a nomeação dos peritos far-se-á pelo juízo deprecado. Havendo, porém, no caso de ação privada, acordo das partes, essa nomeação poderá ser feita pelo juízo deprecante, conforme autoriza o art. 177 do CPP. Após a análise do perito (tanto oficial como não oficial), será elaborado, no prazo máximo de dez dias (podendo haver prorrogação, em casos excepcionais, a requerimento dos peritos – art. 160 do CPP), um laudo contendo minuciosa descrição acerca de tudo o que foi examinado, bem como as respostas aos quesitos formulados.

De acordo com o § 5.º do art. 159 do CPP, modificado pela Lei 11.690/2008, durante o curso do processo judicial, é permitido às partes, quanto à perícia:

I
requerer a oitiva dos peritos para esclarecerem a prova ou para responderem a quesitos, desde que o mandado de intimação e os quesitos ou questões a serem esclarecidas sejam encaminhados com antecedência mínima de 10 (dez) dias, podendo apresentar as respostas em laudo complementar;
II
indicar assistentes técnicos que poderão apresentar pareceres em prazo a ser fixado pelo juiz ou ser inquiridos em audiência.

No tocante à prova pericial, existem dois sistemas de apreciação do respectivo laudo: o vinculatório, pelo qual o juiz não pode deixar de aceitar o seu conteúdo, estando, portanto, vinculado à sua conclusão; e o liberatório, segundo o qual o magistrado não está adstrito à conclusão do laudo, podendo rejeitá-lo no todo ou em parte e desde que haja fundamentação. O art. 182 do CPP adotou o sistema liberatório, até mesmo em razão de o sistema de apreciação das provas adotado pelo nosso ordenamento jurídico ser o do livre convencimento motivado.


O exame de corpo de delito poderá ser feito em qualquer dia e a qualquer hora, sendo aconselhável realizá-lo logo que a autoridade tenha conhecimento da infração (será mais precisa a perícia se realizada próxima da consumação do delito). A única exceção existe em relação ao exame necroscópico (ou autópsia, ou necropsia), que deve ser realizado pelo menos seis horas depois do óbito, salvo se os peritos, pela evidência dos sinais de morte, julgarem que possa ser feito antes daquele prazo, o que declararão no auto (art. 162 do CPP). 

Na hipótese de lesão corporal grave em razão da incapacidade da vítima para as ocupações habituais por mais de 30 dias, deverá ser realizado um outro exame, chamado de complementar, após o trigésimo dia (art. 129, § 1.º, I, do CP e art. 168, § 2.º, do CPP), sob pena de não ficar caracterizada a lesão corporal grave ou  gravíssima.
Os peritos, como sujeitos auxiliares da Justiça, também são passíveis de suspeição.



8. INTERROGATÓRIO DO ACUSADO. AS NOVIDADES INSERIDAS PELA LEI 11.900/2009 (VIDEOCONFERÊNCIA)

O interrogatório do acusado, até o advento da Lei 10.792/2003, era ato privativo do juiz (ou seja, que não sofre interferência das partes), tendo por objetivo a oitiva do acusado acerca da imputação que lhe é feita, sendo ao mesmo tempo um meio de prova para a acusação e um meio de defesa do acusado.


 Pode ser realizado a qualquer tempo não obstante a fixação dos momentos em que deve ser normalmente efetuado: no flagrante delito; no inquérito policial; em audiência de instrução e julgamento; nos procedimentos ordinário, sumário e do júri; ao término da instrução, tal como já se verificava no Juizado Especial Criminal; no plenário do Júri e nos tribunais.


As características do interrogatório são: 

a) ato personalíssimo, no qual somente o réu pode ser interrogado; 
b) ato produzido oralmente (mas deve ser reduzido a termo); 
c) ato não sujeito à preclusão, que permite ao juiz a sua realização ou renovação até o trânsito em julgado da sentença; 
d) ato individual, ou seja, havendo mais de um réu, cada um deles deverá ser interrogado separadamente; 
e) ato público, podendo ser restringido somente na hipótese prevista no art. 792, § 1.º, do CPP.


A Lei 10.792/2003 trouxe sensíveis modificações no interrogatório do acusado.


Contudo, as grandes mudanças desse meio de prova (e de defesa) foram feitas pela Lei 11.900, de 8 de janeiro de 2009, inserindo no CPP a possibilidade de ser realizado por videoconferência, após o STF haver declarado inconstitucional a Lei 11.819/2005, do Estado de São Paulo, que permitia que se realizasse o interrogatório com o uso de recursos tecnológicos que não exigissem a presença física do réu em audiência.


Vejamos as novidades.

O interrogatório por videoconferência. O novo art. 185 do CPP
Em conformidade com redação do art. 185 do CPP, o acusado que comparecer perante a autoridade judiciária, no curso do processo penal, será qualificado e interrogado na presença de seu defensor, constituído ou nomeado.

De acordo com a Lei 11.900, de 8 de janeiro de 2009, o interrogatório do réu preso será realizado, em sala própria, no estabelecimento em que estiver recolhido, desde que estejam garantidas a segurança do juiz, do membro do Ministério Público e dos auxiliares, bem como a presença do defensor e a publicidade do ato (art. 185, § 1.º). 

Portanto, será de rigor que, em caso de interrogatório do acusado preso no estabelecimento prisional em que se encontrar, lhe seja assegurada a presença de seu defensor (decorrência lógica do princípio constitucional da ampla defesa – direito de defesa técnica), bem como a publicidade do ato (todas as audiências, resguardado o segredo de justiça, devem ser públicas, sob pena de nulidade – art. 93, IX, da CF).


Excepcionalmente, o juiz, por decisão fundamentada, de ofício ou a requerimento das partes, poderá realizar o interrogatório do réu preso por sistema de videoconferência ou outro recurso tecnológico de transmissão de sons e imagens em tempo real. Eis o que consta no § 2.º do aludido art. 185. Esta é a grande novidade no capítulo do interrogatório.

De imediato já se consegue constatar, da própria redação do dispositivo legal, que o interrogatório por videoconferência ou qualquer outro recurso tecnológico é medida excepcional, que exigirá a necessária fundamentação do magistrado. Ademais, tal forma de interrogatório será determinada pelo juiz, de ofício ou a requerimento das partes (acusação e defesa).

Ainda quanto à excepcionalidade da medida, somente será realizado o interrogatório por videoconferência nas seguintes hipóteses, todas elas descritas no § 2.º do art. 185 do CPP: 

I – prevenir risco à segurança pública, quando exista fundada suspeita de que o preso integre organização criminosa ou de que, por outra razão, possa fugir durante o deslocamento

II – viabilizar a participação do réu no referido ato processual, quando haja relevante dificuldade para seu comparecimento em juízo, por enfermidade ou outra circunstância pessoal

III – impedir a influência do réu no ânimo de testemunha ou da vítima, desde que não seja possível colher o depoimento destas por videoconferência, nos termos do art. 217 deste Código

IV – responder à gravíssima questão de ordem pública.

Como se vê, os incisos acima transcritos constituem as finalidades de o interrogatório do réu ser realizado por videoconferência.

Importante ressaltar que o uso de recursos tecnológicos para a realização do meio de prova (e de defesa) em questão não poderá surpreender as partes, vale dizer, realizar-se sem sua ciência. É o que consta no § 3.º do art. 185: “Da decisão que determinar a realização de interrogatório por videoconferência, as partes serão intimadas com 10 (dez) dias de antecedência”.


De acordo com o § 4.º, “antes do interrogatório por videoconferência, o preso poderá acompanhar, pelo mesmo sistema tecnológico, a realização de todos os atos da audiência única de instrução e julgamento de que tratam os arts. 400, 411 e 531 deste Código”. Com tal medida o legislador, adaptando a nova sistemática na realização de audiências nos processos criminais (audiências unas), determina que, em caso de interrogatório por videoconferência, que deverá ocorrer como ato de encerramento da audiência de instrução, o acusado acompanhe a colheita de toda a prova oral também pelo mesmo sistema tecnológico. Assim não fosse, estaria eivado o processo de nulidade, já que o princípio da ampla defesa compreende o direito de presença do acusado a todos os atos do processo, especialmente os instrutórios.

“Em qualquer modalidade de interrogatório, o juiz garantirá ao réu o direito de entrevista prévia e reservada com o seu defensor; se realizado por videoconferência, fica também garantido o acesso a canais telefônicos reservados para comunicação entre o defensor que esteja no presídio e o advogado presente na sala de audiência do Fórum, e entre este e o preso”. Eis o que dispõe o § 5.º. Da leitura do dispositivo, vê-se a necessidade de o acusado contar com dois advogados em caso de interrogatório por videoconferência: um que o esteja acompanhando no local em que se encontrar (ex.: réu interrogado por videoconferência no interior de um estabelecimento prisional que conte com todo o aparato tecnológico) e outro na sala de audiência no juízo em que tramitar o processo-crime. Neste caso, deve-se garantir que os advogados falem entre si, a fim de que se possam realizar todas as perguntas necessárias que assegurem o exercício da ampla defesa do réu, bem como a este seja garantido o acesso ao advogado que se encontre na sala de audiência no fórum, também por algum meio de comunicação (ex.: telefone).

De acordo com o § 6.º, “a sala reservada no estabelecimento prisional para a realização de atos processuais por sistema de videoconferência será fiscalizada pelos corregedores e pelo juiz de cada causa, como também pelo Ministério Público e pela Ordem dos Advogados do Brasil”.

À evidência, em caso de não ser realizado o interrogatório do réu diretamente no presídio em que se encontrar (ex.: por falta de segurança ou local apropriado), ou por videoconferência, sua apresentação será requisitada, a fim de que compareça em juízo (§ 7.º). Aqui o interrogatório será presencial.
De acordo com a redação dada ao art. 186 pela Lei 10.792/2003, depois de devidamente qualificado e cientificado do inteiro teor da acusação, o acusado será informado pelo juiz, antes de iniciar o interrogatório (presencial ou por videoconferência), do seu direito de permanecer calado e de não responder as perguntas que lhe forem formuladas. O parágrafo único, consolidando a garantia constitucional (art. 5.º, LXIII, da CF), acrescenta que o silêncio do réu não importará em confissão nem poderá ser interpretado em prejuízo da defesa.

O interrogatório será constituído de duas partes: sobre a pessoa do acusado e sobre os fatos (art. 187, caput).

Na primeira parte, o interrogando será perguntado sobre a sua residência, meios de vida ou profissão, oportunidades sociais, lugar onde exerce a sua atividade, vida pregressa, notadamente se foi preso ou processado alguma vez e, em caso afirmativo, qual o juízo do processo, se houve suspensão condicional ou condenação, qual a pena imposta, se a cumpriu e outros dados familiares e sociais (art. 187, § 1.º).

Na segunda parte do ato, o acusado será perguntado sobre (§ 2.º):

I
ser verdadeira a acusação que lhe é feita;
II
não sendo verdadeira a acusação, se tem algum motivo particular a que atribuí-la, se conhece a pessoa ou pessoas a quem deva ser imputada a prática do crime, e quais sejam, e se com elas esteve antes da prática da infração ou depois dela;
III
onde estava ao tempo em que foi cometida a infração e se teve notícia desta;
IV
as provas já apuradas;
V
se conhece as vítimas e testemunhas já inquiridas ou por inquirir, e desde quando, e se tem o que alegar contra elas;
VI
se conhece o instrumento com que foi praticada a infração, ou qualquer objeto que com esta se relacione e tenha sido apreendido;
VII
todos os demais fatos e pormenores que conduzam à elucidação dos antecedentes e circunstâncias da infração;
VIII
se tem algo mais a alegar em sua defesa.

De acordo com o art. 188, após proceder ao interrogatório, o juiz indagará das partes se restou algum fato para ser esclarecido, formulando as perguntas correspondentes se o entender pertinente e relevante. As partes, agora, possuem o direito de, ao final do interrogatório, apontar para o juiz questões que merecem ser esclarecidas.

Caso o réu confesse a autoria, será perguntado sobre os motivos e circunstâncias do fato e se outras pessoas concorreram para a infração, e quem são elas (art. 190).

Havendo mais de um acusado, serão interrogados separadamente, acentuando a sua característica de ato individual (art. 191).

Até mesmo o interrogatório do mudo, do surdo ou do surdo-mudo ganhou nova disciplina, após a edição da Lei 10.792/2003, sendo realizado da seguinte forma (art. 192):

I - ao surdo serão apresentadas por escrito as perguntas, que ele responderá oralmente;
II - ao mudo as perguntas serão feitas oralmente, respondendo-as por escrito
III - ao surdo-mudo as perguntas serão formuladas por escrito e do mesmo modo dará as respostas.

Caso o interrogando não saiba ler ou escrever, intervirá no ato, como intérprete e sob
compromisso, pessoa habilitada a entendê-lo (parágrafo único).



Quando o interrogando não falar a língua nacional, o interrogatório será feito por meio de intérprete (art. 193). Se o interrogado não souber escrever, não puder ou não quiser assinar, tal fato será consignado no termo (art. 195).

É importante destacar que a todo tempo o juiz poderá proceder a novo interrogatório de ofício ou a pedido fundamentado de qualquer das partes (art. 196), como inegável consequência do princípio da verdade real.

É sabido que o acusado não pode ser condenado com base em seu silêncio, que não equivale à confissão. Porém, é perfeitamente possível que esse silêncio, considerado como mais um sinal ou elemento de prova, ao lado de outros tantos elementos probatórios, possa ser considerado pelo magistrado quando de seu convencimento pessoal sobre a responsabilidade criminal do acusado. Nada impede o acusado de mentir durante o interrogatório, já que ele, diferentemente da testemunha, não presta compromisso de dizer a verdade. Basta lembrarmos do princípio geral de quem ninguém é obrigado a produzir prova contra si mesmo (nemo tenetur se detegere). 

Entretanto, o réu tem direito de silenciar apenas quando as perguntas forem relativas ao interrogatório de mérito, pois caso haja recusa em responder as perguntas relativas à sua identificação, o fato poderá ser caracterizado como contravenção penal, conforme o art. 68 da Lei das Contravenções Penais. Neste momento processual, parte da doutrina e jurisprudência garantistas asseguram a não ocorrência do crime do art. 307 do CP se o réu atribuir-se falsa identidade para ocultar antecedentes criminais ou, por exemplo, mandados de prisão.


A falta do interrogatório, quando for possível a realização deste no curso do processo penal, acarreta a nulidade do processo.


Importante esclarecer que o meio de prova (e de defesa) ora analisado consagra e materializa o princípio da ampla defesa, constitucionalmente assegurado. Referido princípio divide-se em: 

a) autodefesa
b) defesa técnica

A autodefesa, por sua vez, é formada pelo direito de audiência (direito de ser ouvido, vale dizer, de ser interrogado e de fornecer sua versão para os fatos contidos na acusação) e pelo direito de presença (direito de o réu estar presente a todos os atos realizados em juízo). Já a defesa técnica consiste na obrigatória e irrenunciável intervenção de profissional habilitado (advogado, defensor público ou procurador do estado, onde não houver defensoria pública) durante o desenvolvimento da ação penal.

Importa registrar que o STF, em recente decisão, reconheceu a inconstitucionalidade do interrogatório por videoconferência realizado com fundamento em lei estadual (ex.: Lei n. 11.819/2005, do Estado de São Paulo), dentre outros motivos por usurpação de competência legiferante da União para tratar de processo penal.


Quanto à nova forma de realização de interrogatório por videoconferência, não se sabe ainda qual será a interpretação dos tribunais, especialmente os superiores (STJ e STF). Contudo, ainda 
podemos vislumbrar possível inconstitucionalidade, não mais por usurpação de competência (ex.: lei estadual disciplinando matéria processual penal, o que confronta o art. 22, I, da CF – competência privativa da União para legislar sobre processo penal), mas, ainda, por ofensa ao princípio da ampla defesa.



Cremos que o direito de presença do réu, de índole constitucional (art. 5.º, LV, da CF), assegura a todos os acusados em geral o exercício da ampla defesa, com todos os meios e recursos a ela inerentes. A ouvida do acusado por qualquer meio tecnológico pode influir diretamente na busca da verdade real. A presença física, decerto, não pode ser substituída, segundo cremos, pela tecnologia, por mais avançada que seja. Nada substitui o “olho no olho”, não apenas pelas reações do ser humano, estudadas, inclusive, pela psicologia, mas a necessária espontaneidade do réu, bem como a segurança em estar defronte ao juiz que irá proferir sentença (identidade física do juiz – art. 399, parágrafo 2.º, do CPP).
Ainda que o interrogatório por videoconferência possa ter o condão de trazer economia aos cofres públicos, é certo que deve preponderar, ainda mais em um processo penal, a liberdade, mesmo que em detrimento ao erário.
Esperemos a decisão dos tribunais acerca do tema.


9. CONFISSÃO

A confissão ocorre quando, em juízo, uma das partes reconhece como verdade os fatos que lhe são imputados e capazes de acarretar-lhe consequências jurídicas desfavoráveis.

A confissão é conhecida como um “testemunho duplamente qualificado”, pois objetivamente recai sobre fatos contrários ao interesse de quem confessa, e subjetivamente provém do próprio réu e não de terceiros.

Quanto às espécies, a confissão pode ser simples, complexa ou qualificada.

Será simples quando o autor do fato criminoso reconhecer como verdadeira a acusação que lhe é imputada na denúncia, sem nada mencionar a mais, aceitando-a pura e simplesmente. 
Será complexa quando o réu confirmar a prática do fato descrito na denúncia, atribuindo-lhe, ainda, a autoria de outros crimes não descritos. 
Será qualificada quando o autor confirmar a prática criminosa e invocar alguma causa de exclusão da ilicitude, como a exclusão da antijuridicidade, por exemplo.
Será judicial quando prestada perante autoridade jurisdicional competente e extrajudicial quando prestada no inquérito policial ou fora dos autos da ação penal.

Denomina-se confissão delatória (ou delação, ou chamada de corréu) aquela em que o réu, além de admitir a prática da infração, também incrimina terceiro. A doutrina e jurisprudência dão grande força probatória à delação, mormente porque, em tese, o réu que confessa a autoria de um ilícito penal e, ao mesmo tempo, também o atribui a terceiro, não procura eximir-se da responsabilidade penal, ganhando, portanto, grande relevo.


Pode ser classificada ainda como explícita e implícita. A confissão explícita ocorre quando o confitente reconhece, às claras, espontaneamente a autoria e a materialidade do delito, sendo que a implícita ocorre quando o indivíduo, embora não admita expressamente a acusação, pratica atos compatíveis com aquele que confessa a prática do delito, como, por exemplo, quando efetua o ressarcimento do dano ao ofendido. A confissão implícita não vale como prova direta, mas apenas como prova indiciária.


De acordo com o art. 200 do CPP, a confissão será divisível e retratável, sem prejuízo do livre convencimento do juiz, fundado no exame das provas em conjunto (ou seja, para que a confissão tenha valor é necessário que seja compatível com as outras provas produzidas). É retratável à medida que a pessoa que a fez pode desdizer-se, ou seja, arrepender-se do que disse. Nesse caso, o juiz não pode, sob pena de cercear a defesa, deixar de realizar um novo interrogatório. É divisível pelo fato de poder ser aceita em relação a um dos crimes e recusada para os demais

Para que seja válida, a confissão deve ser livre e espontânea. Lembre-se de que a confissão, quando a infração penal deixar vestígios, não poderá suprir o exame de corpo de delito, direto ou indireto, nos termos do art. 158 do CPP.

10. DECLARAÇÕES DO OFENDIDO

O ofendido é a pessoa titular do direito lesado ou colocado em perigo no crime, mesmo que o crime seja contra a Administração Pública.

De acordo com o art. 201 do CPP, sempre que possível, o ofendido será qualificado e perguntado sobre as circunstâncias da infração, quem seja ou presuma ser o seu autor, as provas que possa indicar, tomando-se por termo as suas declarações. Sendo intimado para tais esclarecimentos, o ofendido que, sem motivo justo, deixar de comparecer, poderá ser conduzido à presença da autoridade (§ 1.º). É a denominada condução coercitiva.

O ofendido não é testemunha (não podendo ser computado como tal) e também não presta compromisso de dizer a verdade em virtude do seu interesse na condenação do réu, muitas vezes motivado pelos sentimentos de ódio e vingança (acentuando a parcialidade de suas declarações); portanto, presta declarações e não depoimento. Assim, quando mente em juízo não pratica crime de falso testemunho (art. 342 do CP), mas pode eventualmente praticar os crimes de comunicação falsa de crime ou contravenção penal (art. 339 do CP) e denunciação caluniosa (art. 340 do CP).

Em determinados crimes, as declarações da vítima ganham enorme força probatória, como, por exemplo, nos crimes sexuais (estupro, atentado violento ao pudor etc.), que, em regra, são praticados às escondidas. Porém, a palavra da vítima deverá ser cotejada com outros elementos de prova para que se possa condenar o réu.

Importante mencionar que o meio de prova em comento ganhou novos contornos por conta da edição da Lei 11.689/2008. A seguir, faremos um resumo das novidades inseridas no art. 201 do CPP:
a) o ofendido será comunicado dos atos processuais relativos ao ingresso e à saída do acusado da prisão, à designação de data para audiência e à sentença e respectivos acórdãos que a mantenham ou modifiquem (§ 2.º);
b) as comunicações ao ofendido deverão ser feitas no endereço por ele indicado, admitindo-se, por opção do ofendido, o uso de meio eletrônico (§ 3.º);
c) antes do início da audiência e durante a sua realização, será reservado espaço separado para o ofendido (§ 4.º);
d) se o juiz entender necessário, poderá encaminhar o ofendido para atendimento multidisciplinar, especialmente nas áreas psicossocial, de assistência jurídica e de saúde, a expensas do ofensor ou do Estado (§ 5.º);
e) o juiz tomará as providências necessárias à preservação da intimidade, vida privada, honra e imagem do ofendido, podendo, inclusive, determinar o segredo de justiça em relação aos dados, depoimentos e outras informações constantes dos autos a seu respeito para evitar sua exposição aos meios de comunicação (§ 6.º).

Cremos que as inovações são muito importantes para a vítima, que passa mais fortemente a ser encarada pela lei como objeto de tutela do Direito Penal.

Finalmente, com a edição da Lei 11.900, de 8 de janeiro de 2009, que alterou o capítulo do interrogatório no processo penal, doravante torna-se possível, caso a vítima de um crime se encontre presa, que, caso arrolada no processo penal para ser ouvida, o seja por videoconferência. Vejamos o que dispõe o art. 185, §§ 8.º e 9.º, do CPP: 

a) aplica-se o disposto nos §§ 2.º a 5.º deste artigo, no que couber, à realização de outros atos processuais que dependam da participação de pessoa que esteja presa, como acareação, reconhecimento de pessoas e coisas, e inquirição de testemunha ou tomada de declarações do ofendido; 
b) na hipótese do § 8.º deste artigo, fica garantido o acompanhamento do ato processual pelo acusado e seu defensor.

11. TESTEMUNHAS

Testemunho, segundo Fernando da Costa Tourinho Filho, “é a declaração, positiva ou negativa, da verdade feita ante o magistrado penal por uma pessoa (testemunha) distinta dos sujeitos principais do processo penal sobre percepções sensoriais recebidas pelo declarante, fora do processo penal, a respeito de um fato passado e dirigida à comprovação da verdade” (op. cit. p.

297). A testemunha, assim, é aquela pessoa que declara em juízo seu conhecimento a respeito do fato, não devendo manifestar suas apreciações pessoais, salvo quando inseparáveis da narrativa do fato (art. 213 do CPP).

Como já visto, a testemunha presta compromisso de dizer a verdade perante o juiz, sendo que o falso testemunho o sujeita às penas do art. 342 do CP. De acordo com § 2.º, com a redação alterada pela Lei 10.268/2001, o fato deixa de ser punível se, antes da sentença no processo em que ocorreu o ilícito, o agente se retrata ou declara a verdade.

Toda pessoa poderá ser testemunha (inclusive crianças e incapazes) devendo, na ocasião do depoimento, declarar seu nome, idade, estado civil, residência, profissão, lugar onde exerce sua atividade, se é parente, e em que grau, de alguma das partes, ou quais suas relações com qualquer delas, além de relatar o que souber, explicando sempre as razões de sua ciência ou as circunstâncias pelas quais possa avaliar-se de sua credibilidade (art. 203 do CPP).

O Código de Processo Penal limita o número de testemunhas com o intuito de impedir a procrastinação do processo. Dessa forma, prevê a lei, de acordo com o processo, um número máximo de testemunhas que podem ser arroladas pela acusação e pela defesa, qual seja:

I
no procedimento ordinário e na primeira fase do procedimento do júri a acusação e a defesa podem arrolar, cada uma, até oito testemunhas por fato criminoso;

II
no plenário do júri (2.ª fase do procedimento) são admitidas cinco testemunhas por fato criminoso;

III
no procedimento sumário o número máximo também é de cinco testemunhas por fato criminoso;

IV
no procedimento sumaríssimo (Juizados Especiais Criminais), pelo fato de a Lei 9.099/1995 não ter especificado o número máximo de testemunhas, a doutrina e a jurisprudência entendem que deverão ser arroladas no máximo cinco testemunhas, tratando-se de crimes (mesmo na hipótese de concurso de crimes); e três testemunhas quando se tratar de contravenção penal.

É importante observar que nesse número não são incluídas: 
a) as testemunhas referidas (que são as pessoas mencionadas no depoimento de outras testemunhas), b) as pessoas que não prestam compromisso, previstas no art. 206 do CPP (informantes), 
c) as testemunhas cujos fatos relatados não sejam interessantes para a decisão da causa. São as chamadas testemunhas extranumerárias (além do número estipulado em lei). Se quiser, o juiz poderá ouvi-las, mesmo sem a provocação das partes. Daí serem chamadas de testemunhas do juízo. A vítima (ou ofendido), quando depõe, não é considerada testemunha.


Segundo o art. 204 do CPP, o depoimento sempre será prestado oralmente, não sendo permitido à testemunha trazê-lo por escrito, o que não impede que ela consulte breves anotações durante seu depoimento.

A testemunha não poderá eximir-se da obrigação de depor. Poderá, entretanto, recusar-se a fazê-lo, de acordo com o art. 206 do CPP, o ascendente ou descendente, o afim em linha reta, o cônjuge, ainda que separado judicialmente, o irmão e o pai, a mãe ou o filho adotivo do acusado, salvo quando não for possível, por outro modo, obter-se ou integrar-se a prova do fato e de suas circunstâncias (estas pessoas também estão isentas do compromisso de dizer a verdade).

São proibidas de depor as pessoas que, em razão de função, ministério, ofício ou profissão, devam guardar segredo, salvo se, desobrigadas pela parte interessada, quiserem dar o seu testemunho. 

Função é a atividade de natureza pública (exemplo: tutor, curador, diretor de hospital etc.); ofício é a atividade de natureza predominantemente manual (exemplo: sapateiro, marceneiro); ministério é a atividade de cunho eclesiástico ou assistencial (exemplo: sacerdotes, freiras etc.); e profissão é a atividade predominantemente intelectual (exemplo: advogados, médicos etc.).

Não se deferirá o compromisso de dizer a verdade aos doentes e deficientes mentais e aos menores de 14 anos, nem às pessoas a que se refere o art. 206 do CPP, que serão ouvidas, portanto, como informantes. Logo, seus depoimentos devem ser recebidos com cautela pelo magistrado. Afinal, sequer prestam compromisso.

As testemunhas serão inquiridas uma de cada vez e isoladamente, de modo que umas não saibam nem ouçam os depoimentos das outras, devendo o juiz adverti-las das penas cominadas ao falso testemunho, de acordo com o disposto no art. 210 do CPP. Para assegurar a incomunicabilidade das testemunhas, antes do início da audiência e durante a sua realização, serão reservados espaços separados, nos termos do novo parágrafo único, inserido pela Lei 11.690/2008.

As partes poderão contraditar a testemunha (logo após a qualificação) ou arguir circunstâncias ou defeitos que a tornem suspeita de parcialidade, ou indigna de fé, conforme estabelece o art. 214 do CPP (nesse último caso, a contradita é denominada arguição de defeito). A contradita, portanto, é o mecanismo processual adequado para a arguição de suspeição da testemunha a ser apresentado no momento oportuno, sob pena de preclusão.

Importante alteração no tocante à prova testemunhal é a inserção, no sistema processual penal brasileiro, do cross examination, adotado, por exemplo, nos EUA, em substituição ao sistema presidencialista, até então adotado. Até o advento da já citada Lei 11.690/2008, as perguntas das partes eram dirigidas ao juiz, que as formulava à testemunha (sistema do exame judicial ou presidencialista). 

Todavia, com a nova redação do art. 212, as perguntas serão formuladas pelas partes diretamente à testemunha, encerrando-se, pois, o sistema presidencialista de audiência, substituído pelo já referido cross examination (as partes inquirem a testemunha diretamente, sem intermediação do juiz). Muito embora não caiba mais ao magistrado a formulação das questões das partes às testemunhas, é certo que não admitirá aquelas que puderem induzir a resposta, que não tiverem relação com a causa ou que importarem em repetição de outra já respondida.

Se o juiz verificar que a presença do réu poderá causar humilhação, temor, ou sério constrangimento à testemunha ou ao ofendido, de modo que prejudique a verdade do depoimento, fará a inquirição por videoconferência e, somente na impossibilidade dessa forma, determinará a retirada do réu, prosseguindo na inquirição, com a presença do seu defensor. Trata-se de novidade também inserida ao CPP pela Lei 11.690/2008, que permite que, se a testemunha ou vítima se sentirem humilhadas, com medo ou constrangidas de prestarem depoimento ou declarações na presença do réu, sejam inquiridas por sistema eletrônico (videoconferência). Somente se esta forma digital não for possível de ser realizada, o réu sairá do recinto de audiência, permanecendo, contudo, seu defensor.

O depoimento da testemunha será reduzido a termo, assinado por ela, pelo juiz e pelas partes. Se a testemunha não souber assinar, ou não puder fazê-lo, pedirá a alguém que o faça por ela, depois de lido na presença de ambos.

Se, regularmente intimada, a testemunha deixar de comparecer sem motivo justificado, o juiz poderá requisitar à autoridade policial a sua condução coercitiva, poderá aplicar multa, determinar o pagamento das diligências ou, ainda, responsabilizá-la por crime de desobediência (art. 219 do CPP). As pessoas impossibilitadas por enfermidade ou por velhice de comparecer para depor serão inquiridas onde estiverem.

De acordo com o art. 221 do CPP, o Presidente e o Vice-Presidente da República, os senadores e deputados federais, os ministros de Estado, os governadores de Estados e Territórios, os secretários de Estado, os prefeitos do Distrito Federal e dos Municípios, os deputados estaduais, os membros do Poder Judiciário, os ministros e juízes dos Tribunais de Contas da União, dos Estados, do Distrito Federal, bem como os do Tribunal Marítimo serão inquiridos em local, dia e hora previamente ajustados entre eles e o juiz.

Apenas o Presidente e o Vice-Presidente da República, os presidentes do Senado Federal, da Câmara dos Deputados e do Supremo Tribunal Federal poderão optar pela prestação de depoimento por escrito, caso em que as perguntas, formuladas pelas partes e deferidas pelo juiz, ser-lhes-ão transmitidas por ofício (art. 221, § 1.º, do CPP). Nesse caso, não há que se falar na oralidade que, em regra, rege a colheita dos depoimentos.

A testemunha que morar fora da jurisdição do juiz será inquirida pelo juiz do lugar de sua residência, expedindo-se, para esse fim, carta precatória, com prazo razoável para o seu cumprimento, devendo as partes ser intimadas sobre o feito. A expedição da carta precatória não suspenderá a instrução do processo (art. 222, § 1.º, do CPP). Nessa hipótese, é importante conhecer o conteúdo da súmula 273 do STJ: "intimada a defesa da expedição de carta precatória, torna-se desnecessária intimação da data da audiência no juízo deprecado". 


Novidade, acerca da inquirição de testemunhas por precatória, foi inserida pela Lei 11.900, de 8 de janeiro de 2009. A partir de agora, será possível que, na hipótese prevista no caput do art. 222, a oitiva de testemunha seja realizada por meio de videoconferência ou outro recurso tecnológico de transmissão de sons e imagens em tempo real, permitida a presença do defensor e podendo ser realizada, inclusive, durante a realização da audiência de instrução e julgamento.

Os mesmos meios tecnológicos podem ser utilizados se a testemunha estiver presa e houver sido arrolada pelas partes para prestar depoimento, ou se tiver que reconhecer pessoas ou coisas, ou participar de acareação (art. 185, § 8.º, do CPP, com o novo tratamento que lhe foi dado pelo diploma legal acima referido).

Por derradeiro, em caso de testemunha residente no estrangeiro, em local sabido, será necessária a expedição de carta rogatória, cumprida pelas vias diplomáticas. Todavia, o magistrado somente irá deferir a expedição de rogatória para oitiva de testemunha se demonstrada previamente a imprescindibilidade da medida pela parte requerente, devendo esta arcar com os custos de envio. Este é o teor do novo art. 222-A do CPP, inserido pela Lei 11.900/2009.


Quanto à testemunha residente em outro país arrolada pelo réu, a redação do já referido art. 222-A parece colidir com o princípio constitucional da ampla defesa, caso levada ao pé da letra. Afinal, se requerida a expedição de rogatória pelo acusado, como poderá ele demonstrar judicialmente, por exemplo, que o depoimento a ser prestado pela testemunha é imprescindível? Como poderá antecipar os esclarecimentos que serão prestados pela testemunha, provando ao juiz que são imprescindíveis?


Assim, embora o cumprimento de uma carta rogatória seja, de fato, custoso, é certo que o réu não poderá ver a colheita de prova oral negada pelo motivo indicado na lei (prévia demonstração da imprescindibilidade da medida), até pelo fato de não ser possível ao réu fazer prova de fato negativo (ex.: se a testemunha fosse ouvida, poderia ter sido absolvido).

Imagine que o réu arrole testemunha residente nos EUA, afirmando ao juiz que, na data dos fatos, estava em sua companhia, razão pela qual não poderia ter matado o réu, que se encontrava no outro lado da cidade. Logo, mais do que plausível a oitiva da testemunha. Cremos que a expedição de rogatória não poderá ser negada. Todavia, não poderá o juiz, para analisar a imprescindibilidade da medida, determinar ao réu que demonstre que a testemunha se encontrava em sua companhia na data do crime. Tal prova seria, repita-se, impossível no mais das vezes.


Assim, a prévia demonstração de ser a expedição da rogatória imprescindível deve ser exigida com parcimônia, sob pena de cerceamento de defesa. Apenas para afirmarmos a possibilidade de utilização do novel dispositivo, poderia o juiz indeferir a expedição de rogatória se outro meio de prova pudesse suprir o depoimento da testemunha, ou mesmo se o réu afirmasse, por exemplo, que esta não se encontrava no local dos fatos na data do crime.

12. RECONHECIMENTO DE PESSOAS E COISAS


De acordo com o art. 226 do CPP, quando houver necessidade, o reconhecimento de pessoas será feito da seguinte forma:

I
a pessoa que tiver de fazer o reconhecimento será convidada a descrever a pessoa que deva ser reconhecida;

II
a pessoa, cujo reconhecimento se pretender, será colocada, se possível, ao lado de outras que com ela tiverem qualquer semelhança, convidando-se quem tiver de fazer o reconhecimento a apontá-las;

III
se houver razão para recear que a pessoa chamada para o reconhecimento, por efeito de intimidação ou outra influência, não diga a verdade em face da pessoa que deve ser reconhecida, a autoridade providenciará para que esta não veja aquela;

IV
do ato de reconhecimento lavrar-se-á auto pormenorizado, subscrito pela autoridade, pela pessoa chamada para proceder ao reconhecimento e por duas testemunhas presenciais.

O parágrafo único do aludido artigo determina que o disposto no inciso III não terá aplicação em qualquer das fases do procedimento do tribunal do júri.

A jurisprudência admite com restrições o reconhecimento fotográfico devendo ser utilizado apenas quando não for possível o reconhecimento pessoal e desde que observado, ainda, o procedimento previsto no art. 226 do CPP. Julio Fabbrini Mirabete destaca que “por ter um valor relativo e possuir um caráter precário que pode conduzir a um lamentável engano, o reconhecimento fotográfico, isoladamente, não pode fundamentar uma decisão condenatória” (op. cit. p. 309).

Para o reconhecimento de objetos, o procedimento a ser adotado é o mesmo do previsto para o reconhecimento de pessoas, naquilo que for compatível (art. 227 do CPP).

O Código de Processo Penal não previu o reconhecimento fotográfico. Embora não esteja explicitamente previsto em lei, é certo que não é vedado. Porém, deve-se atentar que se trata de meio de prova bastante precário, que pode conduzir a erros gravíssimos, mormente quando inexistirem outros elementos de prova nos autos a apontar a autoria delitiva.

13.  ACAREAÇÃO


A acareação, segundo Julio Fabbrini Mirabete, “é o ato processual consistente na confrontação das declarações de dois ou mais acusados, testemunhas ou ofendidos, já ouvidos, e destinado a obter o convencimento do juiz sobre a verdade de algum fato em que as declarações dessas pessoas forem divergentes” (op. cit. p. 310).

Dispõe o art. 229 do CPP que a acareação pode ser feita entre acusados, entre acusados e testemunhas, entre testemunhas, entre acusado ou testemunha e a pessoa ofendida, e entre as pessoas ofendidas, sempre que divergirem em suas declarações, sobre fatos ou circunstâncias relevantes. Os acareados, caso ainda persista a dúvida, serão reperguntados para que expliquem os pontos de divergências, reduzindo-se a termo o ato de acareação (parágrafo único). É também um meio de prova no qual o juiz procurará esclarecer a real verdade dos fatos.


Dois são os requisitos da acareação: 

I – que as pessoas a serem acareadas tenham prestado depoimento perante o mesmo juízo e sobre os mesmos fatos e circunstâncias; 

II – que o fato divergente seja relevante.


A acareação pode ser feita tanto na fase do inquérito policial quanto na instrução criminal (art. 6.º, VI, do CPP) e, quando as pessoas estiverem em comarcas distintas, poderá ser realizada por intermédio de carta precatória (art. 230 do CPP).

14. PROVA DOCUMENTAL

Documento é todo o escrito, instrumento ou papel público ou particular, que condensa graficamente o pensamento de alguém, a prova de um fato ou a realização de algum ato dotado de significação ou relevância jurídica. Instrumento, vale destacar, é todo o documento confeccionado para provar a prática do ato nele representado.



O documento pode ser público, quando for elaborado por funcionário público no exercício de suas atribuições, ou particular, quando elaborado por qualquer outra pessoa (que pode ser o funcionário público que não esteja no exercício de suas atribuições). O art. 297, § 2.º, do CP equipara, para os efeitos penais, a público todo o documento emanado de ente paraestatal, o título ao portador ou transmissível por endosso, as ações de sociedade comercial, os livros mercantis e o testamento particular.

Os requisitos indispensáveis dos documentos são: verdade e autenticidade. A verdade refere-se à existência real do que está contido ou relatado no instrumento. A autenticidade é a certeza legal de que o escrito partiu da pessoa a quem o documento é atribuído.

Em regra, os documentos são apresentados pelas partes (Ministério Público, querelante, acusado, querelado), mas o juiz pode determinar a apresentação de documentos aos autos, art. 234 do CPP (princípio da verdade real).

Segundo o art. 231 do CPP, salvo os casos expressos em lei, as partes poderão apresentar documentos em qualquer fase do processo. A juntada pode ocorrer mesmo após a conversão do julgamento em diligência, visto que não se pode prejudicar a prova por meio de prazos e atos próprios para a sua apresentação. Porém, o art. 479 do CPP, alterado pela Lei 11.689/2008, impede que nesse mesmo procedimento se proceda à produção ou leitura de documento que não tiver sido comunicado à parte contrária e tenha sido juntado aos autos com antecedência de pelo menos três dias. A violação aos referidos dispositivos importará no reconhecimento de prova ilegítima, portanto, vedada.


A fotocópia autenticada de cheque, para fins do exame de corpo de delito em crime de estelionato, art. 171 do CP, vale pelo original.

Os documentos em língua estrangeira, sem prejuízo da sua juntada imediata, serão, se necessário, traduzidos por tradutor público, ou na falta deste, por pessoa idônea nomeada pela autoridade. As cartas particulares, obtidas por meio criminoso ou fraudulento, não poderão ser exibidas em juízo (art. 233 do CPP e art. 5.º, XII, da CF). O juiz também poderá requisitar, caso haja necessidade, a ficha médica contra quem se atribui a prática do crime de aborto.


Se qualquer das partes entender que um documento juntado aos autos é falso, deverá suscitar a instauração da exceção de falsidade documental (vide capítulo 6 – Questões e processos incidentes).

15. INDÍCIOS


De acordo com o art. 239 do CPP, considera-se indício a circunstância conhecida e provada, que, tendo relação com o fato, autorize, por indução, concluir-se a existência de outra ou outras circunstâncias.

O indício e as presunções são espécies de provas indiretas. Vale recordar que provas indiretas são aquelas cuja representação do fato ou circunstância a se provar ocorre por meio de uma construção lógica. A presunção, que não se confunde com o indício, é um conhecimento fundado sobre a ordem normal das coisas e que dura até prova em contrário.

O álibi, que significa etimologicamente “em outra parte”, “em outro local”, representa toda alegação fática feita pelo acusado visando demonstrar a impossibilidade material de ter participado do crime. 

Trata-se, assim, de um indício negativo cuja prova verdadeira da sua efetiva ocorrência nos permite concluir ser outra pessoa o autor da infração.


A prova indiciária (ou circunstancial), desde que traga a certeza da circunstância indicante, tem o mesmo valor das provas diretas em virtude da adoção do princípio da livre convicção do juiz. Afinal, os indícios são meio de prova e devem ser valorados pelo magistrado quando do julgamento da lide penal. Não se confundem com as “meras suspeitas”, estas sim absolutamente rechaçadas pelo Direito Penal e Processo Penal pátrios.

16. BUSCA E APREENSÃO

Busca e apreensão é a providência determinada pela autoridade policial (na fase do inquérito policial) ou pelo juiz com o fim de procurar e conservar pessoas ou bens que tenham relação com o fato criminoso. Trata-se de uma medida acautelatória e coercitiva que pode ser ajuizada antes mesmo da instauração do inquérito policial, durante este, na fase da instrução criminal e durante a execução penal (art. 145 da Lei 7.210/1984 – disciplina a busca e apreensão de condenado liberado condicionalmente que pratica nova infração durante o período de prova), podendo ser determinada de ofício ou a requerimento das partes (art. 242 do CPP).

De acordo com o art. 240 do CPP, a busca domiciliar, quando fundadas razões a autorizarem (fumus boni iuris), será realizada para: 
a) prender criminosos; 
b) apreender coisas achadas ou obtidas por meios criminosos; 
c) apreender instrumentos de falsificação ou de contrafação e objetos falsificados ou contrafeitos; 
d) apreender armas e munições, instrumentos utilizados na prática de crime ou destinados a fim delituoso;
e) descobrir objetos necessários à prova de infração ou à defesa do réu; 
f) apreender cartas, abertas ou não destinadas ao acusado ou em seu poder, quando haja suspeita de que o conhecimento do seu conteúdo possa ser útil à elucidação do fato (ATENÇÃO: apesar de constar expressamente do art. 240 do CPP, essa hipótese não foi recepcionada pela Constituição Federal de 1988 que consagra, no seu art. 5.º, XII, a inviolabilidade do sigilo das comunicações); 
g) apreender pessoas vítimas de crimes; 
h) colher qualquer elemento de convicção.

Para a realização da busca domiciliar, é importante destacar que a autoridade deverá agir dentro dos limites traçados pelo art. 5.º, XI, da CF, que trata do direito à inviolabilidade do domicílio. Se o morador se recusar a permitir a efetivação da medida, a autoridade poderá arrombar a porta e forçar a entrada, admitindo-se até mesmo o emprego de força contra coisas existentes no seu interior para o descobrimento do que se procura (art. 245 do CPP). Estando ausente o morador, qualquer vizinho que estiver presente será intimado a assistir à diligência (art. 245, § 4.º, do CPP).

A busca pessoal, de acordo com o art. 240, § 2.º, do CPP, consiste na revista do corpo da pessoa, suas vestes e demais acessórios e será realizada quando houver fundada suspeita de que alguém oculte consigo arma proibida ou algum dos objetos relacionados nas alíneas b a f e h do § 1.º do art. 240, com exceção das cartas (cuja hipótese não foi recepcionada pela Constituição Federal de 1988) e das vítimas (alínea h). Quando tiver que ser feita em mulher, a busca será realizada por outra mulher (exemplo: policial feminina) desde que não acarrete retardamento ou prejuízo da defesa (art. 249 do CPP), caso em que poderá ser feita por homem.

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